Artroplastias de Quadril
Desde o final do século XIX, é rotina para o ortopedista, especialmente os cirurgiões de quadril, a procura por alternativas que propiciem a reintegração dos seus pacientes à rotina cotidiana. Com a ampla disponibilidade de recursos disponíveis, é possível obter sucesso nessa empreitada.
E quando se trata da reconstrução do quadril, estão disponíveis duas alternativas: as artroplastias totais do quadril e as hermiartoplastias, substituindo unicamente o segmento femoral.
ANQUILOSE DO QUADRIL
Há muito tempo se tem conhecimento das deformidades que acometem o fêmur, mas se iniciaram as tentativas de corrigi‐las somente em 1826 com Barton, por conta das osteotomias para correção de anquilose do quadril.
Anos depois, em 1915, Murphy, em Chicago, fez o que foi considerada a primeira artroplastia do quadril.
Vale ressaltar que a substituição da articulação degenerada por uma outra, artificial, durante muito tempo ficou restrita apenas ao sonho do médico ortopedista.
Vamos à cronologia:
1890 – É inserida uma bola de marfim sobre o colo do fêmur;
1923 – Primeira artroplastia com molde de vidro;
1939 – É utilizado o vitálio como material de interposição;
1943 – É construída uma endoprótese de cromo‐cobalto, com sobrevida do paciente de 3 anos e morte não relacionada à cirurgia;
1946 – Utilizada a endoprótese com cabeça femoral e haste de acrílico, com reforço central metálico.
1950 (início) – Introdução de próteses caracterizadas por cabeça sólida de grande diâmetro com colar (conceito de unipolaridade).
1970 (início) – Introdução da hemiartroplastia, com objetivo de reduzir a força de fricção entre a cabeça metálica e a cartilagem acetabular.
PRÓTESES UNIPOLARES
Originalmente, a hemiartroplastia era restrita à uma cabeça sólida de grande diâmetro com colar, que pretendia estimular o crescimento ósseo e melhor fixação da haste, sendo mais utilizado a prótese de Austin‐Moore e que exigia, no mínimo, de 1 a 2 cm de colo femoral intacto, acima do trocânter menor.
Em 1966, foi constatado que ela tinha boa propensão para mudanças que fossem restritas à cabeça femoral, sendo notada pouca recuperação na ampliação dos movimentos em 25 pacientes no pós‐operatório, no hospital, na média de 10 semanas. Conclusão: pacientes portadores de osteoartrose teriam restrição para utilizar essa prótese já naquela década.
A prótese de Thompson tinha cabeça sólida e colar mais vertical para ser apoiado sobre a base do colo do fêmur, para propiciar maior apoio cortical e maior estabilidade.
A cimentação ortopédica, nos anos 60, trouxe maior estabilidade da haste femoral.
D’arcy e Devas publicaram experiências utilizando prótese cimentada em 361 casos que envolveram fraturas do colo femoral, onde os pacientes foram observados por 3 anos e 82% apresentaram resultado satisfatório e a maior parcela dos insatisfeitos tinha idade inferior a 75 anos, sendo as complicações mais relevantes relacionadas à erosão acetabular e dor.
Uma série de 160 hemiartroplastias apontou perda de espaço articular depois de 4 anos em 25% dos casos, dos quais 5% apresentaram acentuada protrusão acetabular.
Depois de 5 anos, houve uma elevação desses números para, respectivamente, 64% e 24%, incluindo rápida evolução no processo degenerativo vinculado à artroplastia.
Foi Philips quem comprovou a relação da incidência de protusão acetabular com o nível de mobilidade física aferida nos pacientes, atingindo a marca de 90% nos ativos e praticamente nula nos pacientes inativos.
PRÓTESES BIBOLARES
A implementação das próteses bipolares certamente foi impulsionada pelas experiências realizadas em clinica ortopédica utilizando próteses unipolares, cujo sucesso foi restringido por causa do desgaste acetabular e também pela dor que os pacientes sentiam.
Nos anos 70, foram desenvolvidos modelos de próteses que tinham, basicamente, nestes 3 componentes:
‐ Haste femoral tendo a cabeça com tamanhos variáveis;
‐ Componente de polietileno para se articular com a cabeça femoral;
‐ Cabeça metálica para se articular com a cavidade acetabular.
Estudos foram desenvolvidos para aferir a modularidade da prótese bipolar. Estudo realizado envolvendo 100 próteses bipolares no período após 1 ano de implantação, com 24 quadris contendo cartilagem acetabular normal, dos quais 76 apresentavam alterações degenerativas.
A prótese bipolar nas fraturas do colo femoral tem proporcionado resultados bem animadores em estudos recentes, aferindo satisfação nos pacientes associada à queda da erosão acetabular.
MENOR SANGRAMENTO E TRANSFUSÕES
Parker e cols observaram 455 pacientes com mais de 70 anos e que apresentavam fratura do terço proximal do fêmur, que foram divididos em grupos com dois critérios: para fixação interna e para hemiartroplastias.
O primeiro grupo acusou tempo inferior de anestesia, com menos sangramento e menor necessidade de transfusões, enquanto mais de 90 pacientes tiveram que passar por 111 procedimentos cirúrgicos.
Do segundo grupo apenas 15 procedimentos cirúrgicos se fizeram necessários envolvendo 12 pacientes.
Os autores recomendaram a fixação interna nos pacientes com idade inferior a 70 anos e, para os pacientes com mais de 70 anos, as hemiartroplastias, devido à probabilidade de terem que ser efetuados novos procedimentos cirúrgicos, resultando no aumento da morbidade.
Quando são comparadas as hemiartroplastias com prótese total devido ao desgaste de quadril, podemos perceber que os estudos recentes apontam uma sensível preferência para prótese total, particularmente nos pacientes que fossem mais ativos biologicamente.
Atualmente, é constatada uma demanda funcional, que deverá ser observada com atenção, pois dois pacientes, por exemplo, com 70 anos podem apresentar abordagens distintas quando sofrerem o mesmo tipo de fratura, o que faz com que o tratamento a ser recomendado tenha que ter um critério totalmente individualizado.
Blomfeldt e cols realizaram estudos em 120 pacientes e que tinham idade média de 81 anos, apresentando fraturas desviadas do colo do fêmur. Eles foram randomizados de forma que recebessem a hemiartroplastia do tipo bipolar ou prótese total de quadril, sendo reavaliados no período pós‐cirúrgico entre 4 a 12 meses pelo medico ortopedista.
CONCLUSÕES
Foram observados uma redução no tempo do procedimento cirúrgico e do sangramento intra‐operatório nas hemiartroplastias, não sendo, contudo, identificadas diferenças, ao longo do período, nas complicações e nem, tampouco, na mortalidade. Já a função do quadril, pelo escore de Harris, foi realmente melhor no grupo que recebei prótese total do quadril, conforme estudos comprovados pela literatura moderna que aborda esse assunto.
As hemiartroplastias ainda são indicadas, apesar da quantidade crescente de artroplastias totais de quadril, sendo mais recomendadas as do tipo bipolar, enquanto as unipolares são mais indicadas para pacientes inaptos para marcha e com fraturas desviadas do colo femoral.
Nos pacientes que apresentarem desvios do colo do fêmur, com mais de 65 anos, é recomendada a artroplastia total de quadril.